15.11.08

Morte e Vida Sertralina XI

Quem II

As vezes me pergunto como vai ser quando isso terminar. Quando acabar essa fase, essa passagem, essa experiência. Quem eu vou ser depois disso ? Por mais difícil que seja, você se acostuma. Não ligo de ver mais ela andando pelada por aí assim como não ligo de acordar com esse forte cheiro de mijo. Mas há coisas que eu ainda não me acostumei. A ausência de duas filhas na ajuda pelo que está acontecendo com ela. Poucos se sacrificam ajudando ela. Não é algo que eu espero cobrar - faço isso por ela, somente por ela, que já fez muito por mim. Não me acostumei com a forma agressiva que minha mãe trata ela; gritando sem entender que ela não tem o controle dela mesma, que ela as vezes acorda atordoada e as vezes se sente prisioneira. E pela primeira vez ela não sabia quem eu era. Agarrava com força minhas mãos, como se eu fosse agredi-la, depois que consegui me soltar ela me chamou olhando para o corredor que leva para a cozinha, e eu na frente dela respondi que estava aqui - não me acostumei com isso.
Muitas vezes eu saio para me livrar desse demônio familiar. Uso meios para, por um breve momento, esquecer de tudo que se passa em casa - não que eu culpe os outros pelo que faço, não são motivos. Mas são minhas valvulas de escape.
Quando isso acabar de vez me pergunto o que mais me prenderia a minha família. Com o tempo vamos nos separar. Todos. Já que o que deveria nos unir cada vez está nos deixando exaustos, de mente e corpo. Mas mesmo longe, mesmo separados e distantes estamos todos juntos pois nós dividimos a saúde de nossa mãe.

"E agora, meus amigos, façamos votos para que o demônio familiar de nossas casas desapareça um dia, deixando o nosso lar doméstico protegido por deus e por esses anjos tutelares que, sob as formas de mães, de esposa e de irmãs, velarão sobre a felicidade de nossos filhos!..."

O Demônio Familiar, José de Alencar

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