Só o empirismo e a necessidade salvam! Adaptação. Sempre.
28.7.10
Amores dos Outros
A sensação de superar conceitos e revê-los me agrada muito, sempre que a nova visão for positiva. Assim como uma surpresa boa. Numa mesa de bar, como uma frase esperta e banal escrita num guardanapo, superei meu incômodo pelo amor dos outros. Não era inveja nem algo parecido. Mas pela visão amarga, sistemática e egoísta que eu tenho do amor (e da vida), achava que como eu não sentia ninguém deveria sentir. E assim, desdenhava de sonhos com príncipes encantados, juras de amor eterno e até o brilho embriagado e abobalhado dos olhos de um apaixonado.
Não é porque você não quer amar que os outros não podem amar. Aceitei o amor que os outros sentem, mesmo não acreditando nele. Assim como respeito a religião das multidões fervorosas de fiéis, mesmo não tendo fé em nada.
Não mais debocho das ilusões e desejos que os outros sentem, agora curto tudo como se estivesse ouvindo uma música bobinha sobre o amor.
12.7.10
Uma adaptação séria
Durante a madrugada o cheiro de merda tomava o quarto. Sabia que ela estava dormindo pelos roncos. Virava de um lado para o outro respirando pela boca. Acordou com ela tentando se levantar. Com os pés na cara dele. Já estava sem as cobertas, cheiro forte, fralda carregada e lençol sujo. O despertador só ia tocar daqui a uma hora. Quando a semana começa marrom é porque a coisa vai ficar preta. Chamou a mãe para ajudar a avó. Enquanto arrumava o banheiro, fazia companhia para evitar que saísse da cama e espalhasse a sujeira pela casa.
Aos poucos ela saia da cama rumo ao banheiro para o banho. A mãe com muita ânsia de vomito e ele pondo os lençóis no lixo. Sentou no computador para ouvir música e tentar animar a manhã. Não estava irritado nem nada. Já estava acostumado. Só gostava de ouvir música pela manhã. Depois do banho a avó estava sentada do lado dele numa poltrona. Ela chamou e disse algo incompreensível. Levantou para ajudá-la e mais uma vez disse algo que ele não entendeu levando a mão para as partes intimas. Perguntou se ela queria ir ao banheiro e ela disse que sim. Mal foi para o corredor e mais sujeira no chão. Vazava pelas calças. Imaginou a reação da mãe, nervosa, irritada, gritando e xingando muito. Mas não, pela primeira vez não fez isso. Parecia acostumada também. Só achava a situação triste. E era mesmo. Assim como desesperadora.
Depois de outro banho na velha, foi a vez dele de usar o banheiro. Costuma ter as melhores idéias ali. Seja no trono ou no chuveiro. Lembrou deu uma não tão boa. Ontem indo dormir, pensou em relatar um dia da sua vida e fez uma promessa para si mesmo que ia ser no dia seguinte. Repensou na decisão. Seria hoje um bom dia? O dia começou interessante. Não bom, mas tinha um começo.
No quarto, antes de se trocar, pegou no armário seu caderno de anotações e começou a escrever sobre o dia de hoje. Terminou meia página quando percebeu que ia se atrasar para o trabalho. Pensou uma vez antes de tomar o café preto porque seu estomago não estava tão bem, mas tomou mesmo assim. Precisava ficar mais desperto. Aplicou insulina na avó, deu um beijo e saiu. Preparou os fones e acertou o mp3. Na primeira parada do ônibus enquanto esperava a baldeação, resolveu escrever mais um pouco. Sacou da mochila o caderno e começou, bem ali na Rio Branco.
Alguns observavam, nem ligou.
No caminho para o trabalho, uma música francesa bem alegre animou a ida. Chegando no escritório resolveu se calar. Não tinha muita coisa pra fazer e não queria muito papo com ninguém. Só queria enrolar e matar a segunda-feira. O que tinha pressentido se tornou realidade. Estava de saco cheio do ambiente de trabalho. As pessoas com seus discursos repetitivos, seus dramas exagerados, as mesmas reclamações vagas e os inconformações de sempre. Foi a primeira vez que não suportou estar lá. Passou todo o expediente com os fones de ouvido e se entediando pela vida dos outros e da sua também. A copeira até questionou o silêncio dele perguntando por que estava calado e não estava reclamando como de costume. Se reclamo, logo existe. Ao pesquisar uma frase para homenagear a morte de Harvey Pekar, se deparou com uma perfeita para o dia de hoje: “Faz você se sentir bem sabendo que há outras pessoas aflitas como você”. Precisa dizer mais?
No almoço, silêncios chatos e sol forte na cara. Precisava de um boné. Voltando para casa, o mesmo caminho rotineiro, o chiclete mascado jogado fora, o beijinho na vovó, a jantinha e etc. Tirou a jeans desconfortável e por um segundo pensou que não tinha roupa para amanhã e logo fez que nem aí. Esperou todos dormirem, sentou no computador, pegou o caderno, digitou todo o texto e publicou em seu blog enquanto ainda não estava escuro.
No caminho para o trabalho, uma música francesa bem alegre animou a ida. Chegando no escritório resolveu se calar. Não tinha muita coisa pra fazer e não queria muito papo com ninguém. Só queria enrolar e matar a segunda-feira. O que tinha pressentido se tornou realidade. Estava de saco cheio do ambiente de trabalho. As pessoas com seus discursos repetitivos, seus dramas exagerados, as mesmas reclamações vagas e os inconformações de sempre. Foi a primeira vez que não suportou estar lá. Passou todo o expediente com os fones de ouvido e se entediando pela vida dos outros e da sua também. A copeira até questionou o silêncio dele perguntando por que estava calado e não estava reclamando como de costume. Se reclamo, logo existe. Ao pesquisar uma frase para homenagear a morte de Harvey Pekar, se deparou com uma perfeita para o dia de hoje: “Faz você se sentir bem sabendo que há outras pessoas aflitas como você”. Precisa dizer mais?
No almoço, silêncios chatos e sol forte na cara. Precisava de um boné. Voltando para casa, o mesmo caminho rotineiro, o chiclete mascado jogado fora, o beijinho na vovó, a jantinha e etc. Tirou a jeans desconfortável e por um segundo pensou que não tinha roupa para amanhã e logo fez que nem aí. Esperou todos dormirem, sentou no computador, pegou o caderno, digitou todo o texto e publicou em seu blog enquanto ainda não estava escuro.
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