31.12.13

Season Finale VII



Fantasmas e Reflexos

Ano passado passei por uma descontrução e desencontro pessoal.

Vai ver não estou quebrado. Vai ser sou assim mesmo...

Se na temporada anterior me desencontrei comigo, nesta que termina agora fui de encontro com uma pessoa inesperada. Meu reflexo. Encontrei nas pessoas que fotografo meu próprio reflexo, um espaço para me encaixar. Todos são fotografáveis, mas poucos se destacam na multidão.

Onde estou agora? Com quem estou? E  para onde estamos indo? Vou me perder. Quero me perder de mim mesmo, mas isso só faz com que eu acabe entrando mais ainda nesta caverna já tão conhecida por mim. Apesar de escura, aprendi a conhecer cada detalhe da parede cavernosa. A maioria dos detalhes me assustam. Outros me observam e eu fico paralisado sem ar encarando a escuridão. Fui eu que mudei? Se não fui eu, então foi essa caverna...

Fiquei doente na caverna. Tive várias doenças e dores memoráveis. Paixões se transformaram em dores. Carinhos invisíveis. Carinhos imaginários. Carinhos platônicos que só eu sentia. E quando terminavam, os fantasmas carinhosos gelavam meu corpo por onde tinham passado. Interrompi esta dor/paixão mais uma vez – com uma experiência de cirurgião. Consegui superar? Nada ainda.

E a caverna foi se fechando. E outra dor surgiu... foi aparecendo devagar, rastejando até se enrolar no meu corpo e me sufocar: a dor do tempo.

Olhava para trás e vi reflexos de reflexos de reflexos infinitos. Nada mudou. Nada muda. E essa dor não tem cura. Preciso aprender que é o melhor remédio. Nada ainda.

Um pensamento intocável virou dor. O pensamento da rejeição antes mesmo de eu nascer. Por isso sou assim? Quantos “talvez” para responder esta pergunta? Nada ainda.

E como controlo o tempo? Meu tempo. O tempo dos outros? Não controlo, mas consigo faze-lo parar. Coleciono centenas de instantes que enxergo por onde ando. E andei. Andei sozinho em lugares desconhecidos. Fiz uma viagem pelo conhecimento de outros lugares. E foi um sonho do qual acordei. Nada ainda.

Dentro da caverna vi meu rosto. E reconheci o reflexo. Nossos olhos se fixaram. Passei meu olhar pelas formas da minha feição. Prestei atenção em todos os detalhes. Em todas as marcas que o breve tempo marcou. Foi assim que me reconheci. Foi assim que doeu novamente. Nada ainda.

E então veio o passado amargo de todos os Agostos. Escrevi antes de dormir que eu tenho certeza de que posso me matar. Também escrevi que o amor e a morte são as minhas únicas saídas. Também escrevi que espero ser encontrado. Como vida em outro planeta. Também escrevi que estou a procura de paixões para adiar a minha própria morte. Escrevi também que quero compartilhar minha solidão. Nada ainda.

E minha caverna deformada ficou menor. E para chegar no Paraíso, algo de terrível tem que acontecer.

Minha solidão conformada e acostumada estava me machucando fisicamente. E a morte da jovem Roberta questionou mais ainda minha própria mortalidade. Eu estava tão frio quanto ela durante seu velório e enterro. Observei de longe. Abracei fortemente a mãe dela e não disse nenhuma palavra. As lágrimas dela molharam minha camisa. Não me importei. Fui atingido pela morte. A dela e a minha. Senti. Uma sensação de entrega. Resolvi me entregar. Resolvi viver mais. Decidi me importar. Com a minha própria vida. Minha própria mortalidade. Perder tudo significa também ter a liberdade de se escolher o que vem a seguir, sem o peso esmagador das expectativas. Basta pular ou ser empurrado. Olhei para a caverna deformada e nela falta, acima de tudo, o empirismo que eu tanto exijo. Queria experimentar e conhecer. 

E conheci. Conheci você, que me quis como eu sou. Mas sou incrédulo e sonhador. Depois te desconheci. Na esperança, o gostar reduz. Na frustração, o gostar acaba. E você se foi. E a saída da caverna é lenta. Nada ainda.

Eu sou o meu outro. Sou meu reflexo. Existo a partir das minhas experiências. Parece que existe algo que pode se desdobrar em minha mente. Que ainda pode me marcar. Mais profundamente. Basta existir para ser completo. Nada ainda.

Instabilidade e incerteza provocam mudanças, mas depois de um tempo tudo pode ficar cansativo e você pode querer estar firmemente onde sempre esteve. Tudo entorpece com o tempo, tudo se torna menos pessoal. Estamos eternamente condenados a ficar sem.

E se nos falta algo, somos incompletos. Se perdemos algo, somos perdidos. Vulneráveis contra perigos e paixões reais e imaginários. E se não faz sentido, tudo bem... Quem precisa disso? Vai ver é assim mesmo.

A ideia da repetição do reflexo assombra ela mesma e se relaciona com as ideias de experiências e pensamentos. O que é perdido são as partes de nós mesmos que esquecemos ou escolhemos esquecer, o que é lamentável são nossos arrependimentos e os nossos limites pessoais impossíveis nos definem.

Tudo o que nos acontece torna-se distante de nós e quando olhamos o reflexo de nossa vida, percebemos que as coisas que queremos esconder na caverna nos fazem ser o que somos. Como então posso desistir do fantasma da caverna ou ir além destes pensamentos e experiências que almejo se eles são partes de mim?

É a ironia e a verdade, meu eterno paradoxo: vivo na caverna e tenho este espaço para preencher a fim de seguir em frente. E embora eu seja a mesma pessoa que era quando entrei na caverna pela primeira vez, evoluí através de minhas experiências e reflexões. Tudo ainda há de vir.

E que eu comece a dançar com dois sorrisos diferentes no rosto. Que eu sorria enquanto estiver indo para casa. Juntando pedaços de amor, sonhos e canções diariamente. Canções que eu consiga dividir com meus homens e mulheres loucos. Que alguém cante para eu dormir. Que a escuridão e o barulho branco preencham minha caverna. Que eu não dê a mínima para o por do sol. Que um dia eu sinta os anéis de Saturno nos meus dedos – que o amor venha do acaso, de forma aleatória. Que eu rasgue o que um dia eu costurei, sorrindo e de olhos fechados e sem propósitos. Que eu me perca fora do espaço e do tempo e não me pergunte onde estou. Que eu me liberte do meu reflexo e desapareça como um fantasma. Nada ainda.

To be continued...


“O resto pertence à vida e à ausência de vida”
Henry Miller

“Há conhecimento da consciência. Ela se vê de um lado ao outro, tranquila e vazia entre as paredes, libertada do homem que a habitava, monstruosa, porque não é ninguém.”
Jean-Paul Sartre


11.12.13

Uma frase sempre martela na minha mente em incontáveis momentos e foi tatuada no meu cérebro para sempre: "NADA é verdadeiro. TUDO é permitido". Esta frase me assombra até hoje, me levando a paradoxos sublimes de pensamentos que me completam e me subtraem algo ao mesmo tempo. Há um véu de incerteza sobre a minha cabeça, onde desconfio de tudo. O que sempre me leva a não acreditar e confiar em mim mesmo.

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