31.12.12

Season Finale VI

Anteriormente em Season Finale...
 


Deconstruções. Vida não segue roteiro, mas sim o acaso.

Preenchimento automático. Uma vida vazia é uma vida desperdiçada. É possível surgir coisas a partir do nada. Não é isso o que pensam os físicos?

O lado bom de não ter uma janela aberta na sua frente é que você pode imaginar o que se passa do outro lado da parede. Quando você imagina as milhares de posibilidades, tudo fica permitido e nada é realmente verdadeiro. Pode se fazer tudo.

Com uma pequena ajudinha dos meus amigos, um ano sem paixões se transformou num ano de posibilidades e mais experiências foram realizadas. Um vento idiota e otimista se confronta com você e te leva adiante.

Apesar de às vezes nos sentirmos sozinhos, a distância e a saudade dos melhores amigos são quebradas pelas lembranças boas e momentos registrados em RGB. E eu sonhei que vi meus amigos. Não preciso deles. Eu preciso deles.

E onde vocês estavam, meus amigos? Acho que as pessoas não conseguem me encontrar.

Fui até lá encontrá-los e algo incrível aconteceu. Acabei me desencontrando comigo mesmo.

Alguns momentos te definem e outros te descontroem.

“E o que seus olhos verdes viram?”

Vi uma janela significativa e a maior que já vi.
Eu vi uma casa acolhedora e quente no dia mais frio do ano.
Eu vi tetos abertos e paredes em pé. Destroços reais que me marcaram.
Eu vi dez mil assentos vazios e ninguém para ocupá-los.
Eu vi sujeira misturada com beleza. E quase ninguém viu.
Eu vi escrituras em paredes nada sagradas.
Eu vi expressões humanas solitárias em buracos escondidos.
Vi pelas pequenas aberturas das portas, uma percepção gigante que ainda assombra minha mente.
Eu vi homens e mulheres abraçados. E homens e homens. E mulheres e mulheres. E crianças e crianças. E o sexo.
Eu vi uma irmã com um sorriso triste.
Vi pessoas parecidas com salgados de boteco.
Eu vi uma sala com mil histórias.
Eu vi espelhos antigos e embaçados. Não sei quem era no reflexo.
Vi uma entrada para coletivos.
Eu vi uma boca escura com bafo quente. E muitos entravam por ela. E seus corpos ficavam lá dentro e somente seus espíritos saíam. Feridos no amor. Feridos no ódio.
Eu vi uma sala de cinema com uma tela escura. E o filme se passava na platéia.
Eu vi uma viagem. Eu vi uma ideia. Eu vi um lugar. Eu vi uma vida. Eu vi um passeio. Eu vi um trabalho. Eu vi um reencontro. Eu vi um encontro. Eu me perdi. Eu vi uma mudança.
Eu vi homens bebendo juntos na paz de mais de 2190 cervejas.
Eu vi espelhos reais em banheiros nojentos.
Eu vi o olhar penetrante de um assassino.
Eu vi doentes terminais jogando a vida.
Eu vi perdidos na indiferença com vícios incontáveis.
Eu vi uma casa escura, clara, sem sol, iluminada, quente e fria e viva e morta.
E foi um frio forte, e foi um frio muito forte que passou. No corpo e na alma.

Do sim ao não, quantos talvez? “Não se preocupe, somos feios, mas nós temos a música.” – eu responderia se você me perguntasse.

E tudo se registra no meu olhar eletrônico: figuras da cidade, perdidos calçados, passageiros da rotina, arquitetura proposital, prostitutas nas paredes, números afogados, tudo são minhas obsessões da memória que vai se perdendo num lugar escuro e inabitável. Tudo precisa ser registrado e marcado para não ser esquecido. Motivos e significados que num futuro próximo vão parecer sonhos dentro de sonhos. Basta olhar para longe para se sentir perto.

Do que se passou, uma pequena coisa: era hora de fingir as boas vibrações que emanavam do céu cinza e chuvoso de abril. A companhia da rotina mais uma vez se fez presente nas semanas de trabalho – para que eu não possa viver eternamente e ficar tão cansado o bastante para não pensar em nada. Mas não entre em pânico, continue vivo e cante para você mesmo canções de ninar… Este é só o acaso, primo da coincidência. E no fim do seu próprio mundo, você flutuará pelo espaço confortavelmente dopado. 

Venha me visitar logo… Com certeza é solitário viver aqui na lua.

18.12.12

A felicidade invadiu seu cérebro e ele não sabia o que fazer. Inundou seu corpo como se estivesse morrendo afogado e não pedia socorro. A felicidade entrava pelas suas narinas e ocupava seus pulmões. E ele não fazia nada. Não havia nada a ser feito. Era o álcool, a música, o balanço do ônibus e a visão de duas freiras sorridentes.

25.11.12

221112

O que eu poderia fazer para dormir melhor? No que eu poderia pensar para dormir mais rápido? Sinto que estou perdendo algo todos os dias. E estamos. Sei que estamos. E perdemos algo que não existe. Só existe no meu pensamento. E se perdemos algo que existe, este algo somos nós mesmos. Eu estou desaparecendo. Deito e fito a escuridão para ouvir o silêncio e nada muda e tudo muda ao mesmo tempo. Tempo é o que eu perco. Tempo para que? Em outro universo eu estou na frente. Em outro nem comecei a pensar ainda. E tem tanto em que pensar. Suspiro e olho para este texto em letras que amanhã não conseguirei ler. Escrevo assim de propósito (?). Desmerecendo e desdenhando o que penso. Ia começar a escrever sobre o porque que comecei a fotografar. Para guardar um momento? Para me guardar? Capturar alguma essência como eles faziam no começo de tudo? Capturar almas. Quantas almas poderei ter? Tantas quantas as perguntas e pensamentos e eus e universos e tempos? Obcecado pela marca, registro, passado e memória. Tudo isso com medo do futuro e louco para que o presente se torne passado. Mais um paradoxo para minha coleção.

20.11.12

Pillow Talk Show II

Ontem a noite eu estava tão indisposto e doente que queria que alguém lesse uma história para eu dormir. Fechei os olhos, virei para o lado, mergulhei nos travesseiros e esvaziei minha mente para eu mesmo me contar uma história.

1.10.12

O Que Se Passa

O que se passa com estes olhos molhados,
                                estes ventos esquecidos,
                                estas mãos caídas?

O que se passa com meu amor gemido
                        com meu amor tremido
                        com meu amor latido
                        com meu amor renegado?

19.9.12

Um dia no Moinho

Eu não sei o motivo porque traí ele. Não existe motivo. Mas foi isso que fez ele atear fogo no meu corpo. Não que eu tivesse merecido, podíamos ter xingado um ao outro ou nos agredido como todo mundo faz. Mas não. Como sempre ele só pensou nele mesmo. Que ideia imbecil de mexer com fogo dentro de um barraco de madeira! Dentro de uma favela! Eu mal levantei assustado e gritando de dor e cai no chão ao me jogar em cima dele. Comecei a rolar no chão inutilmente só para o fogo subir as paredes e chegar ao teto. Quadrado do inferno. As chamas chegaram nos vizinhos ao lado e pude ouvir mais gritos de desespero se juntando aos meus. Foi bem rápido e logo amanheceu.

17.9.12

Visões dos dias que passaram

Tão vazio que às vezes me pego pensando em passageiros do metrô que eu vi apenas uma vez.
Acontece com mais alguém?

5.9.12

Intenções de oração

A entrada para o metrô estava lotada de gente. Por isso saí do terminal para dar a volta ao redor do shopping. A rua Domingos de Morais na altura do Santa Cruz ganha uma forte saturação laranja à noite, mas foi uma torre cinza e bem iluminada estilo gótica contrastando com o céu escuro e sem estrelas que me chamou a atenção. Estava a alguns passos de distância, então decidi ir até lá e fotografar a igreja, mas não consegui devido a forte iluminação que vinha dos holofotes mal colocados. A visão era bonita. A igreja ganhava uma coloração cinza tão poderosa quanto uma fotografia PB. Quando pequeno nunca gostei de igrejas, mas depois que me fundamentei ateu comecei a apreciar o local sagrado de diversos símbolos. Depois de ter estudado história da arte, comecei a prestar bem mais atenção, entrar e reparar nos detalhes arquitetônicos, obras de arte e silêncios que merecem respeito. E foi a primeira coisa que me surpreendeu na paróquia. Tinha me esquecido de como é tão quieto lá dentro. Chega a quase dar uma sensação de paz. Passei pelas laterais, sempre com a câmera na mão, observando as esculturas que decoram o local, o altar suntuoso, o teto enorme e o padrão que desenhava ele. Branco com quadrados azuis e detalhes vermelhos e dourados. Algumas pessoas sentadas aleatoriamente nem preenchiam o local. Ouvi uma tosse. Ao me aproximar do altar escutei uma batida na madeira que ecoou e tirou a concentração dos fiéis. Uma mulher sentada no primeiro banco escrevia ferozmente num pedaço de papel e resmungava algo com voz de choro. Sentei uma fileira atrás da moça que reclamava com Deus sem parar. "Você não vai fazer imundície comigo!", ela esbravejava ignorando a presença de todos. Apontava o indicador para as principais imagens do altar, que a encaravam com seus olhares de piedade. Também ignoravam a presença dela. Algumas carolas pediram para ela respeitar o local e a mulher gritou mandando as senhoras cuidarem de suas vidas. Perguntou para o casal de japoneses idosos ao lado o que eles estavam olhando. Nunca tinha presenciado uma "discussão" com Deus. Ela repetia para ele não trair e não ser imundo com ele. “Seja fiel comigo!”. Cobrava dívidas, promessas e agitava os braços gordos e depois batia com força na madeira. Me perguntei o que ela queria dele, o que esperava dele e imaginei que Deus também tinha essas duvidas. Ela realmente parecia brava com ele e exigia explicações. Resolvi filmar esse momento absurdo, já que só vivendo absurdamente é possível acabar de vez com o absurdo infinito. Ela levantou, depositou os papéis numa urna com os dizeres "intenções de oração" escritos, fez uma reverência para o altar e voltou para seu assento. De relance vi o rosto vermelho e emocionado dela. A essa hora já tinha parado de gravar tudo. Sentada, ela ajeitou o casaco na guarda do banco, se ajoelhou e vestiu uma fita vermelha de cetim. Percebi que a missa ia começar e fui embora.

31.8.12

Stuck in two moments

Pensando sobre arrependimentos acho que tenho apenas dois: o de não ter beijado a Thalita num dia que a encontrei no ônibus e por um segundo que durou 15 minutos, fixamos nossos olhares com apenas poucos centímetros de distância. Até hoje vejo os olhos verdes dela. O outro foi não ter ficado na sala para conversar com meu avô algumas horas antes da sua morte. Até hoje, quando bebo água gelada me lembro dele.

26.8.12

Agostos

Lendo os arquivos do blog (todos do mês de agosto), percebi que nada mudou: a solidão condescendente, a falsa felicidade, a rotina marcante, o autodesgosto, o pessimismo, a desilusão, a frustração... Em 2010 e 2011 não tive agosto.

10.8.12

Dois pensamentos

O que significa quando você enxerga a beleza de um suicídio?


...


Eu sei que um dia vou pirar. Enlouquecer. Explodir. Raiva, desespero, loucura incontrolável. Hoje tenho controle. Mas vai ter um dia que vou bater violentamente minha cabeça no ferro do ônibus. Bater tanto até rachar meu crânio ao meio. Vai ter um dia que eu vou sair gritando no escritório. Desfenestrando num ataque de fúria violento contra computadores e telefones. Principalmente telefones. Vai ter um dia que eu vou olhar para o teto com a bocarra aberta e encarar o nada até começar a babar. Vai ter um dia que eu vou entrar num lugar que eu fique sozinho e tenha privacidade para chorar e inundar este espaço de tanto soluçar. Vai ter um dia que eu vou ouvir uma música bem animada no meu fone de ouvido, subir num pedestal no meio da calçada de uma avenida cheia de gente e começar a dançar pra sempre.Vai ter um dia, que se tudo der certo, vou recitar monológos num quarto branco e decorado com paredes almofadadas. Vai ter um dia que eu vou andar até chegar a lugar nenhum. Vai ter um dia que eu vou praticar uma autolobotomia. Vai ter um dia que eu vou comprar uma passagem para o lugar mais longe e viver uma vida anônima. Vai ter um dia que eu vou querer perder o controle e parar de engolir a seco. Tudo para um bem maior.

10.7.12

Quase

Se tem uma palavra que me defini é "quase". Sou uma pessoa muito "quase". Até na hora de desistir. Eu sempre quase desisto.

25.6.12

Keep Your Solitude To Yourself

Nas últimas 3 semanas, três amigas diferentes vieram conversar comigo sobre a solidão delas. Uma com uma situação bem grave, outra com uma situação inédita para mim (nunca imaginaria essa pessoa reclamando de solidão... Acho que uma prole não é o suficiente... Nada é suficiente, eu sei. A solidão dela me deixou surpreso e curioso). E a outra pessoa sempre sofre de solidão e ainda não superou que nascemos e morremos sozinhos (eu sei, ninguém supera).

Todas essas solidões tem algo em comum: a rejeição. A mais grave foi rejeitada e não esperava isso. Não por ser arrogante, mas fazia tempo que ela não era rejeitada e acredita estar velha demais para esse tipo de coisa, ficando bem depressiva com toda essa situação. Todas elas tem outra coisa em comum, muito mais importante que a rejeição: elas são bonitas, inteligentíssimas, bem sucedidas, bem humoradas, enfim, são pessoas bem interessantes.

Não sei ao certo as rejeições de cada uma delas, mas sei muito bem das minhas. Lembrei de todas que eu sofri. Foram bem poucas, mas todas bem marcantes e sem fazer drama, foram traumáticas. E o fascinante é que como todas minhas paixões foram platônicas, eu aposto que nenhum desses meus amores inexistentes sabiam que um dia chegaram a me rejeitar.

Uma das rejeições mais importantes que aconteceu comigo foi justamente com meu primeiro amor. Não vou estender muito essa história, mas ela ainda é muito especial para mim e dividimos momentos que eu nunca vou esquecer e foram tão significativos para mim (acho que só para mim), que sempre que eu recordo deles sinto um frio nostálgico no esôfago e meus olhos ficam instantaneamente tristes. Os momentos mais mágicos aconteceram em cinemas e com filmes que por ordem do acaso, que é irmão da coincidência, retratavam nas telas o que eu estava passando na vida real. Ainda choro quando os revejo. Como nunca declarei meu amor por ela, Thalita nunca chegou a me rejeitar. Ela idealizava e comentava um certo tipo de amante que tristemente era o oposto do que eu era. Mais alto, mais velho, mais cabeludo, sem miopia e bem mais magro (a ironia, parente maldita do acaso e da coincidência, é que hoje ela é casada com um gordinho).

Muitos anos depois eu tive uma rejeição parecida. Estava tão apaixonado por essa outra pessoa que cada vez eu tocava na mão dela, sentia uma dor horrível. A Carol também declamava seu amor idealizado pelos corpos esbeltos e perfeitos. É muito triste quando alguém que você ama, ama o oposto do que você é. Nesse dia entendi o que significa a frase "você é o que você ama e não o que ama você".

Mas a parte mais triste desta última rejeição foi quando no último dia de trabalho dela no mesmo lugar que eu também trabalhava (e eu sabia que encontra-la novamente ia ser difícil), no momento que nos despedimos, ela me abraçou fortemente, depois olhou nos meus olhos e disse que eu era uma das pessoas mais incríveis e especiais que ela já tinha conhecido. Esse elogio acabou comigo e me fez pensar: se ela me acha tão incrível e gosta tanto de mim por que...? Melhor nem pensar sobre isso...

A rejeição (e a solidão) mais importante da minha vida e a mais traumática é a minha própria rejeição. Mas essa rejeição eu guardo para mim mesmo. Só deixo uma frase que uma outra amiga (também rejeitada pela vida) disse para mim: “Se um dia ele se enxergar como a gente enxerga ele, vai ser amor à primeira vista.” Acho que serve para todos, não?



“... Solitário, tu segues o caminho do amante: amas-te a ti mesmo, e por isso te desprezas, como só desprezam os amantes. O amante quer criar porque despreza! Que saberia do amor aquele que não devesse menosprezar justamente o que amava?”

“... Chamam-vos gente sem coração; mas o vosso coração é sincero, e a mim agrada-me o pudor da vossa cordialidade...” – Nietzsche

10.6.12

Alguns momentos te definem, outros te desconstroem.

28.5.12

Uma Adaptação Séria III

Hoje em dia cada um vive sua própria odisséia pessoal. Um dia inteiro pode ser épico enquanto o outro é um breve capítulo ou nota de rodapé.

Pensamentos sobre a vida e a morte atrapalham o foco no seu trabalho.

O foco no trabalho atrapalhando seus pensamentos sobre a vida e a morte.

(Só no caso de eu explodir)

De repente, o cansaço interrompe minha linha de pensamento. Um cadeirante tentando entrar num ônibus lotado tira a minha atenção. Acho que mesmo no meu quarto vazio eu nao conseguiria escrever sobre os bravos contos de nós, Ulisses. Estou pensando nas dores. Físicas dessa vez. Elas me fazem odiar meu corpo e óbvio, eu mesmo. Um nojo que eu não sentia faz tempo. Penso nos dias que restam até a viagem, quem vou encontrar lá e de como vai ser. Espero que as dores passam até lá... 

Dores físicas e abstratas...

"Quantos dorflex você toma?" Pergunto para uma amiga. Quero (não) sentir algo além das dores.

Uma das três pessoas que me entende me manda uma foto de um monstrinho e ele consegue fazer outro monstro lacrimejar os olhos num metrô lotado.

Quem precisa de um dia se ainda existem instantes maravilhosos?

4.5.12

Uma adaptação séria II


Descendo a rua sozinho, com medo, armado com uma chave que nem sequer era pontuda. O medo de sua mãe herdado para ele. Preocupado, pensou em desistir e ir para casa, mas tinha acabado de chegar onde estava indo. Entrada deserta, uma porta entreaberta. Viu se não tinha ninguém e abriu. Estavam montando o palco. Ainda faltava uma hora para começar o show e era óbvio que ia atrasar. “Amanhã tenho que levantar cedo”, pensou como motivo para ir embora. Daí pensou que da última vez que isso aconteceu tudo deu certo e preferiu atravessar a rua para esperar a fila se formar. Odiava esperar. Odiava filas. Estava sempre adiantado. Pelo menos em seus pensamentos. Quase calculados. Entrou na Fogazzeria e perguntou se eles estavam fechando. Idiota. Nada estava para fechar no baixo Augusta. Tudo começa à noite. Ele sabia disso. Disseram que estavam abrindo. Pediu uma cerveja long neck e escolheu um lugar afastado de um trio de homens que chegaram junto com ele e sentou-se. Enviou uma mensagem para sua mãe, tranquilizando-a dizendo que estava esperando o show começar. Tomou a cerveja devagar pensando em nada e depois em na lan house ao lado para matar o tempo. Decidiu aproveita esse momento sozinho. A cerveja terminou, levantou, pediu outra long neck e uma caneta que pudesse usar. Confirmou se podia mesmo usar a caneta, mesmo ainda em dúvida se ia usa-la ou não. Pegou seu caderno da mochila, abriu nas últimas páginas e clicou a caneta para a ponta aparecer. Desenhou um rosto sombreado e depois desenhou o que achava que sabia desenhar: sua própria caricatura. Desenhou ele mesmo com a boca aberta para variar um pouco e caprichou no volume dos cabelos encaracolados e maltratados pelo dia. Começou a escrever sobre sua descida pela Augusta e de como tinha medo de ser assaltado. Riu. Deu uns goles na segunda cerveja e ao escrever “cerveja” novamente colocou o jota antes do vê. Sinal que estava, sei lá... Disléxico, talvez? Pensou em responder que estava escrevendo sobre ele, caso o mendigo entrasse e perguntasse sobre o que estava escrevendo. Pensou em devolver a caneta, escreveu esta última linha e depois colocou o lugar e a data de hoje. Gostava de registrar as coisas, dando um certo firmamento aos momentos.

São Paulo, 03 de maio de 2012

Fechou o caderno e abriu novamente. Escreveu que quando parou de escrever, levantou a cabeça rápido e sentiu-se um pouco zonzo. Click.

2.5.12

No Bells

O melhor lugar para fumar em paz é do lado de uma igreja a noite. Não sei porque, mas parece que todo mundo que te vê parado e pensativo do lado de uma igreja respeita sua solidão.

21.3.12

Vergonha


A vergonha é uma emoção muito poderosa. Incontrolável e controlável. Intensa vontade de desaparecer.

Medo de que seus defeitos sejam expostos ao mundo (ou uma pequena parte dele que realmente te interessa). 

Vergonha é diferente da culpa, que é o sentimento de ter feito algo "errado". Vergonha não é um comportamento; é se sentir uma pessoa inadequada. A vergonha vem do fracasso de não alcançar um ideal que você acredita que deveria ser.

Vergonha é passiva implicando na falta de algo.

Vergonha é tão forte que "outros" imaginários que você nem conhece podem te rejeitar. Todos te rejeitam. Uma projeção que você faz, o outro lado da idealização. A idealização "negativa". Sua mesma rejeição.

6.3.12

Pillow Talk Show

No meio da noite ele retirou o travesseiro de detrás da cabeça, levantou sobre sua cabeça e pensou no que tinha feito naquele dia e no que deveria fazer no dia seguinte. Também pensou nas coisas que pediram para ele no dia passado e do que esperavam dele nos dias seguintes. Lentamente aproximou o travesseiro sobre seu rosto e as listras da fronha foram tomando formas maiores e se misturando num só tipo abstrato até escurecer de vez. Pressionou o travesseiro com muita força até não poder mais respirar. Como não conseguiu se matar, voltou a tentar dormir virando de lado e abraçando o travesseiro.

23.2.12

Noturno

Nao q eu esteja com fome Nao q eu esteja satisfeito Nao q eu esteja com sono Nao q eu esteja disposto Mesmo com minhas pálpebras fechadas meus olhos estão abertos Eu consigo ver pela escuridão Eu consigo ouvir o silencio Eu consigo respirar o nao respirável Eu consigo sentir o nada Eu consigo tocar a mim mesmo Eu consigo falar comigo  Eu consigo pensar comigo Nada vai me fazer dormir Nada vai me fazer dormir Nada vai me fazer dormir...

14.2.12

Aforismo III

Nada mais feio que beleza excessiva.
 

28.1.12

Aforismo II

De que adianta ser livre hoje se ainda existe amanhã?

21.1.12

Aforismo I

É importante os cães latirem durante a madrugada para lembrarmos de que não estamos completamente sozinhos. E de que algo acontece lá fora.

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